O MINISTÉRIO
PÚBLICO E OS TRIBUNAIS DE CONTAS NA SEPARAÇÃO DOS
PODERES
1.
INTRODUÇÃO
Juridicamente os Tribunais de Contas e os Ministérios Públicos têm garantias como os
outros poderes (garantias, iniciativas reservadas, vedações, autonomia administrativa, financeira,
patrimonial, organizacional...), porém, não
são considerados extra poderes, nem quarto ou
quinto poder já que o constituinte adotou a teoria da tripartição.
Faz-se, então, necessário que estes órgãos,
ainda que autônomos, sejam vistos como integrantes de uma das três funções. Muitos
doutrinadores serão contrários a esse posicionamento, fazendo colocações
“inexplicáveis” de que o MP e o TC não se enquadram em nenhum dos três poderes,
o problema é que na Constituição temos que encaixar, não me importarei
muito se a colocação será falha, entendo que é mais falha a tentativa de colocá-los
fora da estrutura dos poderes em uma condição incompatível com a teoria da
tripartição expressamente utilizada no art. 2º. Portanto, me desculpem aqueles
que forem contrários ao posicionamento aqui adotado.
2.
TRIBUNAIS DE
CONTAS
Quanto aos Tribunais de Contas, o mais aconselhável é identificar os Tribunais
de Contas como órgãos auxiliares da
função legislativa, especializados na fiscalização do controle externo da
atividade administrativa, financeira, patrimonial, contábil e operacional. O
posicionamento de colocá-los junto ao
poder legislativo deriva da função exercida e até mesmo da colocação
constitucional, a seção referente ao controle externo (TCU) está dentro do capítulo do Poder Legislativo.
3.
MINISTÉRIO
PÚBLICO
Quanto ao Ministério Público vou trazer para esse
artigo algumas passagens de um livro sobre o tema do qual fui organizador e
autor (O Ministério Público e a
Constituição Federal de 1988: Tópicos Relevantes, Ed. Grancursos,
Brasília, 2010).
Há autores que sustentam
que o Ministério Público é um quarto poder, porém, conforme Emerson Garcia[1]:
Mantendo-se o
texto constitucional fiel à divisão tripartite das funções estatais, há muito sistematizada por Montesquieu, não há espaço, no atual momento histórico, para discussões sobre ser, ou não, o Ministério Público um quarto poder.
(grifo nosso)
Garcia defende que o Ministério Público, como
Instituição, ocupa posição intermediária
entre órgão e pessoa jurídica[2]. O Ministério
Público chega a ser mais que órgão
por possuir autonomia (art. 127, §2º) e também por possuir personalidade judiciária – que vem a ser a capacidade de
agir em juízo, mas não se pode confundir com personalidade jurídica porque o
Ministério Público não é pessoa jurídica.
Conclui Garcia, no que concordamos, que o Ministério
Público é “órgão sui generis”.[3]
Alexandre de Moraes, citando o Ministro
Sepúlveda Pertence, entende que o posicionamento entre os Poderes é uma questão
secundária, porque o principal ponto é que o
Ministério Público tem independência.[4] Mas, entendemos
que fugir à colocação não resolve o problema, mesmo sendo secundária, a questão
tem relevância e devemos conhecer o posicionamento constitucional do Ministério
Público.
Mazzilli[5] cita que:
Optou o
constituinte de 1988 por conferir elevado status constitucional ao Ministério
Público, quase o erigindo a um quarto
Poder, ao dar-lhe garantias especiais e ao desvinculá-lo dos Capítulos do Poder
Legislativo, do Poder Executivo e do Poder Judiciário. (grifo nosso)
Conclui Mazzilli que as principais funções do Ministério Público são de natureza
administrativa, sem atribuir dependência quanto ao Poder Executivo, “o Ministério exerce atividade
administrativa, até pelo critério residual...”[6]
Guilherme Peña de
Moraes[7] prefere colocar
o MP como Poder do Estado, apesar de o autor admitir que o MP não seja
considerado como tal. Para isso, Guilherme Peña
argumenta que a Constituição Federal concede à Instituição prerrogativas idênticas ou similares às que outorga aos
Poderes:
Diante da
competência do Senado Federal para processo e julgamento do Procurador-Geral da
República nos crimes de responsabilidade (art. 52, inc. II), proibição de
delegação legislativa sobre organização do Ministério Público, carreira e
garantia de seus membros (art. 68, §1º, inc. I), tipificação dos atos do
Presidente da República que atentem contra o livre exercício do Ministério
Público como crime de responsabilidade (art. 85, inc. II), autonomia
administrativa, delimitada como capacidade de direção própria, por meio da
prática dos atos de gestão, organização dos serviços auxiliares, decisão sobre situação
administrativa funcional e elaboração de regimentos internos (art. 127, §2º),
autonomia financeira, demarcada como capacidade de manipulação de recursos
financeiros, com vistas à elaboração da proposta orçamentária, gestão e
aplicação dos recursos destinados ao custeio das atividades do órgão titular da
dotação orçamentária (art. 127, §3º e 168), e garantias e vedações próprias dos
membros do Ministério Público (art. 128, §5º, incs. I
e II).
Nossa posição é
que o Ministério Público exerce atividades que não se enquadram no perfil
constitucional do Poder Judiciário e nem do Poder Legislativo, por isso, assim
como Mazzilli achamos por bem dizer que
o Ministério Público exerce função do Poder Executivo, sem que com isso venha a ser subordinado hierarquicamente à Presidência
da República, como são os Ministérios executivos (Educação, Justiça, Saúde,
Fazenda, Transporte, Trabalho).
O STF,
em julgado isolado, já firmou a
posição de que o Ministério Público se encontra na estrutura do Poder Executivo:
Ministério
Público: atribuição para “adquirir bens e serviços e efetuar a respectiva
contabilização”: constitucionalidade, dado cuidar-se de corolário de sua
autonomia administrativa (e financeira), não
obstante sua integração na estrutura do Poder Executivo.[8]
Garcia[9], criticando a colocação feita pelo
Supremo indaga:
Qual seria,
então, a lógica da mencionada conclusão? A resposta nos parece simples: como o
Tribunal, a exemplo da doutrina clássica, não conseguiu se desatar das amarras
da teoria dos poderes cunhada por
Montesquieu, acrescendo-se que a própria Constituição de 1988, em seu art.
2º, prestigiou a sua literalidade, a
conclusão foi cunhada a partir de um critério
de exclusão. Não sendo o Ministério Público propriamente um órgão
legislativo e, muito menos, jurisdicional, o mais cômodo é incluí-lo sob a
epígrafe do Poder Executivo; afinal, nada mais sobrou. O difícil, no entanto, é justificar como uma Instituição pode estar
integrada em uma certa estrutura organizacional sem
que haja nenhuma, repita-se, nenhuma, vinculação, subordinação ou supervisão em
relação aos órgãos de cúpula desta. (grifo nosso)
Realmente, tem razão Garcia, é difícil
explicar que o MP faz parte do Poder Executivo, mas não se subordina a esse,
que é hierarquizado por natureza. Mas,
concluiremos conforme o STF e a doutrina clássica: o MP exerce atividade
executiva ainda que tal conclusão venha por exclusão.
Vamos ver algumas questões sobre o tema:
CESPE – ANTAQ - Cargo 9: Técnico Administrativo | 19/06/2005
O critério funcional de distinção
entre as funções estatais brasileiras seguiu a célebre separação dos poderes
que obedece à divisão tripartite.
Gabarito: Certa,
realmente não temos mais do que “três poderes”.
CESPE – TRE/TO MANHÃ 2005 Analista
Judiciário – Área: Administrativa – 8 –
Em toda a história republicana
brasileira, adotou-se a teoria da tripartição dos poderes, exceto a partir de
1988, quando a Constituição Federal, além dos Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário, expressamente instituiu o Ministério Público como mais um poder, passando
a vigorar a teoria quatripartite dos poderes do
Estado.
Gabarito:
Errado, embora haja doutrina entendendo que o MP passou a ser um “quarto
poder”, a questão é tranquilamente falsa quando diz que a CF “expressamente
instituiu o Ministério Público como mais um poder”, não há ainda a teoria quatripartite expressamente na CF.
CESPE – HFA – Processo Seletivo –
Aplicação: 28/11/2004 Nível Médio – Prova 12 – Cargo: 50
São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo, o Ministério Público e o
Judiciário.
Gabarito:
Errada, mais tranquila ainda porque repete o art. 2º colocando o Ministério
Público junto, o que torna a questão falsa!
CESPE – TJAC Concurso Público –
Aplicação: 8/9/2002 Cargo: Auxiliar Judiciário
Com a Constituição de 1988, o
Ministério Público passou a integrar os Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, relacionando-se com os Poderes Legislativo, Executivo e,
principalmente, com o Poder Judiciário.
Gabarito:
Errada, novamente o mesmo problema, não há a previsão do Ministério Público
como mais um dos poderes do Estado.
Infelizmente a banca FCC não costuma fazer
questões desse tipo para podermos fixar o seu posicionamento.
Então, por hoje é só e vamos que vamos!!!
André Alencar dos Santos
Brasília, DF - domingo, 13 de janeiro
de 2013
[1] Garcia, Emerson. Ministério Público: Organização, Atribuições e Regime Jurídico. 3ª ed. Revista, ampliada e atualizada. Lumen Juris Editora. Rio de Janeiro, 2008, p. 40.
[2] Idem, p. 41.
[3] Idem, p. 43.
[4] Moraes, Alexandre de. Direito Constitucional. 20ª ed. Atualizada até a EC n. 52/06. Ed. Atlas. São Paulo, 2006, p. 565.
[5] Mazzilli, Hugro Nigro. Introdução ao Ministério Público. Ed. Saraiva. 6ª Ed. Revista e Atualizada, São Paulo, 2007, p. 66.
[6] Idem.
[7] Guilherme Peña de Moraes. Curso de Direito Constitucional. 2ª Edição, revista e atualizada. Ed. Impetus. Niterói, RJ, 2008, p. 458.
[8] ADI 132/RO – Trecho da Ementa do julgado.
[9] Garcia, Emerson. Ministério Público: Organização, Atribuições e Regime Jurídico. 3ª ed. Revista, ampliada e atualizada. Lumen Juris Editora. Rio de Janeiro, 2008, p. 37.