Conheci Elenita como professora e acabamos nos tornando amigos. Tive a oportunidade de ler sua tese, apresentada à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), referência nacional na área de Linguística. Por conta da amizade e admiração, quando soube que ela seria participante da 10a edição do BBB, passei a acompanhar o programa constantemente.
Sempre que mencionava este fato, costumava perceber o espanto das pessoas, que me perguntavam: “Mas juiz federal assiste BBB?”, ao que sempre respondi: “Juiz também é gente, ora".
É fato! Existe um patrulhamento sobre o que “certas pessoas" podem ou não fazer, sobre o que é cabível ou não para quem exerce determinado cargo ou função. Da mesma forma que Elenita, senti-me também rotulado. Afirmo isto, pois observei como esta “sister" recebeu, por muitos, um rótulo como "a doutora", o que fez com que sofresse alguns preconceitos e pressões.
Só que tanto eu, como você, como Elenita, somos pessoas múltiplas! Ninguém esgota seu caleidoscópio humano em uma única atividade ou profissão. Se alguém assim o faz, corre o risco de perder inúmeras coisas. Enquanto faço esta avaliação, lembro de minha mãe, uma mulher fantástica, que teve que enfrentar a "síndrome do ninho vazio", simplesmente porque nunca pensou que seria importante ter criado outros espaços e motivos para viver. Da mesma forma, tenho visto alguns executivos e empresários bem sucedidos financeiramente, mas frustrados por não terem se permitido viver outras dimensões que a vida oferece.
Elenita pode ser mestra, pela UnB, e ainda uma doutura, pela Unicamp, mas isso não faz dela um ser sem outras possibilidades de atuação. Prova do que que falo está no seu interessantíssimo hobbie : ser DJ. Durante os finais de semana ela amplia sua participação (e diversão) no mundo. O que era apenas interesse e diversão, acabou virando um ofício, já que passou a receber muitos convites para tocar, já antes de participar do BBB.
Nada melhor do que fazer do próprio hobbie uma oportunidade de lucro emocional e financeiro. Até porque, qualquer um de nós precisa do vil metal para pagar as inexoráveis contas do cotidiano. Eu, por exemplo, me divirto, me realizo e também sou remunerado sendo professor, palestrante e escritor...
Mas, voltando a falar da multiplicidade de papéis, Elenita, além do papel de ex-BBB e doutora naquilo que faz, é ainda filha, irmã, professora. Gosta de festas, é bloggueira, participa de redes sociais, malha, curte a vida, enfim.... Foi dela, em entrevista após deixar "a casa", o mérito de deixar claro que o BBB é um programa de entretenimento, sem muito compromisso com tantas responsabilidades. Talvez, por causa deste formato, este reality show seja tão criticado por muitos. Ninguém tem que ser doutor ou intelectual, ou qualquer coisa que seja, 100% do seu tempo.
Creio que cada um se diverte e escolhe seu lazer como bem quer, se o BBB for a opção marcada, qual o problema? Obviamente, tenho também minhas críticas e questionamentos em relação ao programa. Recentemente, cenas eróticas e indevidas para o horário e veiculação em TV aberta, surtiram efeitos negativos, ou melhor, constrangedores e chocantes. Exatamente por serem dadas a liberdade e o respeito àqueles que assumem sua opção sexual em público, que a mesma liberdade e respeito precisam ser devolvidos aos que não desejam participar de uma intimidade exibida de forma tão imposta e confrontadora, mesmo que por meio de um canal televisivo. Limites devem valer para qualquer opção sexual. Refiro-me, sendo mais direto, às simulações de sexo oral com uma garrafa. Tais posturas e “posições", sejam estratégicas ou não no jogo, soam como falta de limites. Para mim, enfraquecem o cenário, que em momentos como esses demonstra-se nitidamente influenciado pela lei do “vale tudo”. Um programa interessantíssimo do ponto de vista humano e da análise das relações interperssoais, e de entretenimento, acaba perdendo muito.
Também me chama atenção, perceber que a busca de (ao menos na casa) um consenso quase geral sobre a legitimidade de uma postura homossexual seja imposto aos que possuem opiniões opostas. O sujeito “machão", neste caso, passa a ser a anomalia do ambiente por firmar sua convicção sexual como homem. Creio que tais ensaios de defesa e acusação são um exercício que necessita ser voltado para o bem de todos, jamais para a exclusão, seja do homossexual, seja do heterossexual. Existe uma linha tênue entre exigir respeito e entre exigir anuência. A heterofobia é tão ruim quanto a homofobia, e conceder a qualquer grupo que seja "'licença" para patrulhar opiniões é ruim. Nao podemos tão somente inverter a mão do preconceito.
Sem dúvida, há aspectos bem interessantes no programa, quando ressalta o mistério e complexidade das relações humanas, a proliferação de merchandising pensado, as provas de resistência, o script dos diálogos... E, de maneira especial, o destaque dado à diversidade entre os perfis dos participantes foi a melhor diferenciação nesta edição. A criação de uma "tribo de cabeças" e não apenas o foco em corpos sarados causou boa impressão. Sem demérito algum para as magrinhas, é muito bom poder ver padrões diferentes de corpo físico, como também um foco maior nos quesitos intelectuais.
Como sou contra patrulhas de pensamento, religião, cor, opções de vida, decidi escrever sobre alguns episódio deste singular BBB 10. Acredito que, enquanto alguém não está violando a lei ou um padrão moral mínimo, e nem explorando ou defraudando o próximo, ou querendo impor nossa opinião à força, o certo é optarmos pela tolerância. Aliás, o que nos torna iguais é justamente sermos tão diferentes. Aprender a conviver com isso é o próximo passo nesse grande confinamento em que estamos: o planeta Terra.
Fonte: William Douglas, juiz federal no RJ e professor
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