Existem centímetros maiores que os outros e, talvez, injustos, acredite. Explico. Acabei de receber o seguinte e-mail:
"Boa tarde, Dr. William Douglas! Há um ano, eu havia feito contato com o senhor. Identifiquei-me como soldado da Polícia Militar do Estado de Goiás e disse, após ler o livro "Como passar em provas e concursos", que retornaria em breve para dar a notícia de uma aprovação.
Pois bem, fui aprovada em um concurso de Oficiais da Polícia Militar do Estado do Tocantins. Claro que não é um grande concurso, mas, para as mulheres, a concorrência é ferrenha, pois são apenas 4 vagas.
Eu fui a 2ª colocada e esta aprovação teve uma grande contribuição do senhor, porque "aprendi a aprender" e desenvolvi algumas técnicas que funcionaram para mim. Fiquei muito feliz com essa vitória e passei a acreditar mais em mim, já que, por muitas vezes, me julgava incapaz de disputar uma vaga dentre tão poucas.
Apesar da alegria pela aprovação, enfrento um problema neste meu concurso. Já realizei 4 etapas: prova de capacidade física, avaliação psicológica, avaliação médica e odontológica, nas quais logrei êxito. O fato é que fui reprovada no exame antropométrico por causa de 1cm! Fiquei muito chateada porque eu já sou policial militar há 8 anos.
Enfim, impetrei um mandado de segurança e almejo uma notícia positiva. Mesmo com essa adversidade, continuarei prestando outros concursos, buscarei crescer mais como pessoa e como profissional.
Finalmente, quero lhe dizer que vim apenas cumprir uma promessa: a de comunicar uma "futura", agora "presente" aprovação. Mais uma vez, muito obrigada pelos seus maravilhosos ensinamentos. Um grande abraço. C. V."
Tecnicamente, o requisito de altura é razoável e a reprovação seria justa. Por outro lado, se a pessoa já é policial militar no Estado vizinho, há oito anos, não vejo como não poderá ser uma boa policial no Tocantins. A federação é uma só, o Estado Brasileiro é um só, de modo que me parece que o bom senso deveria impedir a reprovação por esse detalhe, aliás, tão pequeno. Apenas 1 cm. Alguém passar em 2º lugar, numa disputa por 4 vagas, ser aprovada em tudo e não ser empossada por causa de 1 cm de diferença torna esse centímetro, sem dúvida alguma, o maior centímetro do mundo.
A hipótese suscita uma série de questões jurídicas, as mais interessantes, e algumas de alta indagação e complexidade, mas não seguirei por esse caminho. Direito é, antes de tudo, bom senso. Embora seguindo as regras, a decisão me parece equivocada e espero que seja revista pelo Judiciário. Isso faz parte do ofício do magistrado: por vezes precisamos intervir onde a Administração Pública está de mãos amarradas. Creio que a verificação de que a candidata já é policial há 8 anos daria espaço para a exceção, mesmo em sede administrativa, mas é da tradição do Executivo ser mais rigoroso nesses pontos. O Judiciário, então, é a via para se evitar injustiças e, nesse caso, creio que está havendo uma.
Ver uma mulher, soldado PM, ser aprovada para Oficial, após 8 anos de casa... ser aprovada em todos os quesitos (intelectual, médico-odontológico, psicológico) e não entrar seria uma lástima. O crescimento profissional (de Soldado para Oficial) mostra uma das características mais belas de nosso país e de nossa República: a mobilidade social, a chance de melhorar, de crescer, de estudar e alcançar novos degraus. Perder isso por causa de um centímetro? Eu diria que isso equivaleria a quilômetros, léguas e léguas, de falta de sabedoria e sensibilidade.
Estou certo que alguém que chega lá, apesar do trabalho como soldado e de todas as dificuldades naturais para o estudo, é uma pessoa de força e garra; estou certo que toda a experiência acumulada em 8 anos como Soldado dará a esta Oficial expertise excelente. Os "anos de estrada" (e não de "janela") farão dela uma excelente Oficial.
Então, por já ser policial, e por tudo o que eu disse, estou certo que a grande derrota, se esta guerreira não entrar, não será dela. Será da Polícia do Tocantins, será do Estado do Tocantins que, por um mísero centímetro, deixará de prestigiar a Polícia, a Mulher, o Estudo, a República. Este é um país onde as pessoas podem melhorar de vida. Para quem, e digo isso pela terceira vez, já é policial há 8 anos, não ser admitida por 1 cm de diferença seria iniquidade. O inverso dela, a equidade - princípio e valor moral admitido, admirado e recomendado no Direito e na Administração Pública - indica que o melhor caminho é se admitir a moça.
A reprovação antropométrica na hipótese seria uma enorme, abissal e estratosférica, mostra de incapacidade de realmente medir a estatura de uma pessoa. O homem é medido pelo seu conjunto, pela sua alma, pela mente, pela sua história, por todo o conjunto. Oito anos de polícia valem mais que um centímetro; a superação idem, a capacidade idem. Nem vou citar Napoleão, que conquistou a Europa e hoje não entraria em nenhum concurso militar por causa do tamanho. Melhor, cito-o: se alguém pode ser comandada e lutar contra o crime com a altura que tem, como não poderia fazê-lo comandando, atividade mais mental que a primeira? Ambas as atividades possuem os dois conteúdos (força e compleição física + intelectual), mas, é óbvio que o cérebro não precisa nem é medido por número de centímetros.
Por todas as razões, guardo-me ansioso, mesmo na idade e com a experiência que tenho, pela decisão que virá. Torço pela sensibilidade na decisão judicial em relação à qual sou espectador como cidadão e concurseiro, como republicano e crente na superação e na melhoria de vida. Quero crer que, mesmo a Administração Pública e a Polícia Militar do Tocantins, ficarão felizes de ver alguém, com essa história, ingressar nos seus quadros. Torço por essa mulher guerreira não ser vedada por 1 cm, já que carrega tanto mais e maior consigo. Torço por todos que terão maior esperança, ou menor, no concurso, no país e na Justiça, após essa decisão. Torço muito, pois, afinal, não é certo, nem direito, ou justo, ou razoável, que um centímetro possa ser tão grande. Centímetros têm que ter seu tamanho. Apenas homens e mulheres podem ser maiores.
Fonte: www.pciconcursos.com.br por William Douglas.
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